Contemplo o que não vejo
Contemplo o que não vejo.
É tarde, é quasi escuro,
E quanto em mim desejo
Está parado ante o muro.
Por cima o céu é grande;
Sinto árvores além;
Embora o vento abrande,
Há folhas em vaivém.
Tudo é do outro lado,
No que há e no que penso.
Nem há ramo agitado
Que o céu não seja imenso.
Confunde-se o que existe
Com o que durmo e sou.
Não sinto, não sou triste,
Mas triste é o que estou.
7-9-1933
PESSOA, Fernando, Poesia: 1931 – 1935 E Não Datada, ed. Manuela Parreira da Silva, Ana Maria Freitas e Madalena Dine. Lisboa: Assírio & Alvim, 2006, p. 155