Obra

“Esta tendência para criar em torno de mim um outro mundo, igual a este mas com outra gente, nunca me saiu da imaginação.” 

Fernando Pessoa viu publicada uma parte muito pequena da sua extensa obra, que tem vindo a ser editada em vários livros desde 1942. Deixou mais de 25 mil folhas com texto que são espólio à guarda da Biblioteca Nacional de Portugal. A demorada compreensão e organização destes papéis explica o longo intervalo com que a obra de Fernando Pessoa tem vindo a ser publicada.

A singularidade de Fernando Pessoa é visível não só nos textos, mas sobretudo pela original criação de figuras literárias, a quem atribuiu vida e obra próprias. Numa carta dirigida ao escritor português Adolfo Casais Monteiro, a 13 de Janeiro de 1935, Fernando Pessoa identifica os três heterónimos, “personagens sem drama”: Alberto Caeiro, Ricardo Reis e Álvaro de Campos e o  semi-heterónimo Bernardo Soares, e apresenta uma narrativa para a sua origem que pode ser vista na carta original.

Fernando Pessoa começou a escrever poemas em criança – o seu primeiro poema data de 1895, quando tinha sete anos. Fê-lo desde logo em português, mas depressa passou a usar também outras línguas (o primeiro em inglês é de 1901). Começou pela poesia e alargou-se cedo a outros géneros como as notícias, charadas e anedotas que couberam no jornal O Palrador. Esta publicação, elaborada na íntegra por Pessoa, com cinco números editados no primeiro trimestre de 1902, tinha direcção assinada por Pedro da Silva Salles e contava com vários «colaboradores»: Pad Zé, Pip, Dr.º Pancrácio e Diabo Azul, entre outros. Em adulto, ao escrever a Adolfo Casais Monteiro sobre a heteronímia, recordou Chevalier de Pas, uma invenção da sua infância de que resta apenas o registo de nascimento (as primeiras palavras conhecidas da escrita de Pessoa).

Até à sua morte, não abandonou nenhuma destas facetas. A par da poesia, escreveu ensaio, teatro, correspondência vária, novelas policiárias e dedicou-se também à astrologia, além de ser inventor, crítico literário e publicitário. Apesar da sua ocupação profissional ser a de «correspondente estrangeiro em casas comerciais» (ocupava-se da redacção de cartas em língua estrangeira) manteve-se sempre ligado a projectos editoriais e revistas, como a Orpheu, a Athena e a editora Íbis. Além dos heterónimos Alberto Caeiro, Ricardo Reis e Álvaro de Campos e do semi-heterónimo Bernardo Soares, o número de figuras por si criadas e relacionadas com a autoria de textos ou poemas ascende a mais de uma centena, como António Mora, Jean Seul de Mérulet, Dr. Pancracio, Charles Robert Anon, Alexander Search ou Abílio Quaresma.

As suas últimas palavras foram escritas a lápis, em inglês, na véspera da sua morte: I know not what tomorrow will bring (Não sei o que o amanhã trará).