Vivem em nós inúmeros

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Vivem em nós inúmeros;  
Se penso ou sinto, ignoro  
Quem é que pensa ou sente.  
Sou somente o lugar  
Onde se sente ou pensa. 

Tenho mais almas que uma.  
Há mais eus do que eu mesmo.  
Existo todavia  
Indiferente a todos.  
Faço-os calar: eu falo. 

Os impulsos cruzados  
Do que sinto ou não sinto  
Disputam em quem sou.  
Ignoro-os. Nada ditam  
A quem me sei: eu escrevo.

 

 

13-11-1935 

 

 

REIS, Ricardo, Poesia, edição Manuela Parreira da Silva. Lisboa: Assírio & Alvim, 2000, pp. 137-138