Rita Taborda Duarte
Fala é sopro que não voz
Para os orientais, fala é toda ela espírito, sopro contínuo,
Alma da boca (…) brisa flutuante que se vinha apoderar do ouvido.
Herder, Ensaio sobre a origem da linguagem
Falo.
Mas a fala é sopro que não voz.
Não são cordas cordas não
tão bem sabemos que é a metáfora inútil quando morta.
Chicote.
Um chicote, sim, de puro nervo reteso golpeando-me
A palavra dita: e o timbre se ressoa é o do castigo o sulco vivo
Nem sei se cesura, se censura.
Só para te dizer: se é som que digo se te digo o amor- palavra-dita
Está já morrente esse amor esvaído no dizer
Uma palavra- amor- quase- cadáver respirando a custo sob
A carne golpeada.
Escrevo então. Mas a escrita é brisa não é flexão de mão.
E as letras estas letras com que te escrevo
O amor-palavra, rendilhado no papel, fiapos secos só:
A carne amadurecendo no apodrecer da página.
Como grafar o a da palavra amor se o a redondo do amor-palavra-escrita
É já híbrido gemido retalhado …
O amor se é amor é amor não dito amor-palavra-tacto
Sem voz e sem vogais:
Sussurro só de brisa
Sopro leve
Secando rente aos lábios.
Rita Taborda,
Roturas e Ligamentos, ilustrações André da Loba. Lisboa: Abysmo, 2015, p. 13.